sexta-feira, 28 de agosto de 2009

A cor e o Meio Urbano

Uma das coisas mais interessantes no restauro de monumentos históricos é o resgate das feições arquitetônicas e, dentre elas, a busca pela cor original. Mas o que é mesmo a cor original de uma edificação que ao longo dos anos, sujeita às intempéries, desbota, descasca ou até mesmo muda de cor dependendo do humor e gosto de seu proprietário? Cheguei a conclusão que cor original não existe. O que existe é uma sucessão de combinações que temporariamente satisfaz a seu proprietário e que provoca dinamicidade da edificação. É claro que salvaguardamos algumas exceções que estabeleceram sua identidade a partir da sua cor como a Casa Branca e a Casa Rosada.
Comparado a um imóvel, a cidade também está sujeita a esta dinamicidade, porém pode estabelecer, além de tudo, uma identidade.
A adoção de uma cartilha de cores é muito comum também na conservação de áreas urbanas (sítios) históricos, neste caso, para direcionar nas escolhas dentro de um partido coerente com as cores que se usava na época original das edificações, pois sabemos que, até bem pouco tempo, havia uma grande limitação técnica de tintas a base de cal restringindo-se ao branco, amarelo, azul, rosa e verde claros.
A evolução tecnológica da fabricação de tintas teve como conseqüência uma explosão ilimitada de cores que nos deu inúmeras possibilidades; até mesmo transformar as lojas de tintas numa espécie de self service de cores ao alcance de todos.
Recordo-me da última visita ao interior do Estado de Alagoas quando conheci a cidade de Piranhas, ao longo do Rio São Francisco. A paisagem no final da tarde revelava, além da beleza local, uma combinação de cores perfeita demais para uma cidade interiorana. As cores suaves não só das cores primárias, mas também nas inúmeras variações de lilás, roxo, salmão e beges, revelavam sutilmente a escolha proposital daquela combinação não compatível com uma cidade que surgiu no século XVII. Soube posteriormente que a Prefeitura local se encarregava todos os anos, de pintar cada casa e, a escolha dessas cores, também estava a cargo do Município. A idéia foi acolhida pela população, que apreciou, assim como nós turistas. A verdade é que essa política motivou a conservação de todos os outros ambientes da cidade como praças e ruas que, milagrosamente, tinham bancos em réguas de madeira pintados de branco sem nenhum arranhão ou ato de vandalismo como pichações ou declarações de apaixonados. A partir daquele dia entendi que podemos mudar valores e hábitos com ações muito mais simples do que imaginamos.
Também podemos ver exemplos do outro lado da moeda quando nos depararmos com cidades inteirinhas pintadas em cores absurdamente incompatíveis, justamente por serem elas as cores de um partido político ou mesmo adotado pelo gestor em sua campanha. E assim as cidades mudam de cor a cada quatro ou oito anos, e muitas vezes, sob o protesto dos próprios moradores que vêem empurrados por “goela a baixo” ou, melhor, por “olhos a dentro”.
De uma maneira ou de outra, com ou sem discernimento estético, a partir do momento que pintamos o meio urbano também estamos provocando uma sensação de cuidado e limpeza, o que me parece bastante importante e necessário para uma população que sente tanta dificuldade de manter uma cidade limpa assim como a sua própria casa.
A idéia de limpeza também pode ser observada no novo estilo que vem surgindo nos últimos anos com a idéia clean da arquitetura moderna. O tão usado e abusado branco percebido nas novas edificações se baseia na idéia de ambiantes limpos, não só na concepção de elementos arquitetônicos, com o uso de formas puras, mas também no cuidado do uso, quase que totalmente, da cor branca. É facílimo perceber o que digo; basta dar uma passeada na Avenida Álvaro Calheiros e Mário de Gusmão onde encontramos os mais variados exemplos de estabelecimentos comerciais como lojas e galerias que mostram fortemente essa tendência ou mesmo passear nos novos loteamentos onde a maioria das casas também são concebidas assim. E assim, mesmo se tratando de imóveis particulares, cria-se um ambiente construído com características peculiares ao nosso tempo, fáceis de identificar,futuramente, como uma idéia de nossa década.
Pois bem, a verdade é que penso que a cor é fundamental na nossa vida, nos renova, e, assim como nós, os espaços urbanos também. A dinâmica da vida colorida muda nossas escolhas e sensações, humor e temperatura. Nos diferencia também.
Quando cursei a especialização em restauro de sítios e monumentos históricos na UFBA, Salvador, ficava surpresa com tanta “alegria visual”! Apesar de só, sentia-me confortável e acolhida. Tinha a sensação plena de que realmente se tratava de um povo alegre: tinha a alegria das cores, não só nos prédios, mas nas encostas pintadas ou trabalhadas com mosaico colorido, ou mesmo nos pisos das praças e monumentos. Lembro também do verde de João Pessoa e Aracajú. Falar dessas cidades é fácil; mas, e a nossa cidade?
Maceió está crescendo todos os dias. Os espaços públicos estão se renovando e se padronizando. A beleza e o verde do canteiro da Avenida Fernandes Lima e da Praça do Centenário tem me animado todas as manhãs que passo para ir ao trabalho. As flores estão lindas (a mistura de cores é fantástica). Aplauso para Ricardo Ramalho e sua equipe!
As esculturas coloridas fazem a diferença nas praças, os painéis artísticos de Jaraguá são de uma sensibilidade animadora. Penso que começamos a entender como podemos mudar nossa cidade com iniciativas como estas e a cada ação, há uma ótima reação da sociedade que acolhe, aplaude, admira, e o melhor, não picha!

2 comentários:

  1. Parabéns garota! Muito bom seu Blog. Beijos. Cristina

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  2. Parabéns Gardênia, nós aqui da SEMPMA ficamos muito felizes com as suas cosiderações a respeito do nosso trabalho nas intervenções paisagísticas em Maceió.

    Um abraço.
    Juliana Falcão
    Arquiteta-SEMPMA

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