segunda-feira, 2 de novembro de 2009

O Maior cego é aquele que não quer VERDE

Passando pela Av. Fernandes Lima, não pude deixar de ver aquele tóten em forma de árvore que indicava: Um milhão de árvores! Uma contagem decrescente e otimista de uma meta interessante para a nossa cidade. Vejo isso como uma forma de Paisagismo Ambiental. Como diz meu amigo Ricardo Ramalho "o maior cego é aquele que não quer verde".
Creio eu que se tem a pretensão de demonstrar a sociedade que a qualidade de vida está diretamente associada ao entorno ambiental. E aí me lembro de um assunto importante e recente, o qual foi tema de um trabalho de conclusão de curso que orientei: o Eco-Urbanismo. Com ele lembramos que somos parte integral do ecossistema e não parte desassociada do meio ambiente como é encarado pelo urbanismo tradicional.
A idéia é propor a toda a sociedade uma nova forma de realizar urbanismo, com uma proposta multidisciplinar, minimizando o impacto ambiental e maximizando a qualidade de vida. Nele estão inclusos orientações no sistema viário – priorizando o pedestre, o veículo não motorizado e o coletivo –; saneamento e drenagem – reciclagem de lixo, reabastecimento do lençol freático -; paisagismo e outros.
Focado na sustentabilidade, sabemos que o efeito multiplicador desse processo tem conseqüências muito positivas nos âmbitos econômicos, diminuindo desperdícios e gerando novas oportunidades empresariais, como também na área social.
Entende-se também que as condicionantes para construir na cidade são as mesmas tanto para o setor público quanto para o privado.
Em recente premiação da ADEMI-AL, que elegeu os melhores projetos do ano, o grande vencedor foi justamente o ECO – edifício que associa qualidade de projeto dentro de princípios ecológicos.
Percebe-se nos últimos lançamentos imobiliários a preocupação de aumentar a eco eficiência das edificações. Propõem-se o uso racional e reaproveitamento de águas, captação e armazenamento da água das chuvas e das águas servidas (da pia, chuveiro, tanques, etc.) para serviços de limpeza, manutenção dos jardins e descarga em vasos sanitários, aproveitamento de recursos como ventilação natural e da luz do sol.

Curiosidade: Em Dubai, Emirados Árabes, será construído em 2010 um prédio ecológico, giratório e auto-suficiente, abastecido com energia eólica e solar, que será o primeiro de sua espécie. O segundo com as mesmas características será construído em Moscú, Rússia em 2011 e o terceiro em New York em 2012.
Estas torres terão uma altura de 420 metros e permitirá a seus residentes rotacionar seu pavimento o quanto quiserem, sendo possível a mudança da forma de todo o edifício.
Os edifícios do futuro serão verdadeiros eco sistemas que imitarão o equilíbrio natural, levando em conta as mudanças de estação, temperaturas, luz do sol e incorporando a vegetação


Li recentemente na internet que nos Emirados Árabes de Abu Dhabi, em Masdar, se está construindo a cidade mais ecológica do planeta que será inaugurada em 2016. Nessa futura metrópole, não poderão circular carros e só existirá um sistema de transporte composto por trens magnéticos. O desenho contemplou a orientação nordeste a sudoeste da cidade para obter o maior aproveitamento de luz e sombra. Estará abastecida energeticamente por luz solar e torres de vento, e os edifícios não superarão cinco pavimentos. Poderá abrigar cinqüenta mil habitantes e terá 6,5 km2 (seis e meio quilômetros quadrados).Curiosidade não falta pra visitar esta cidade, mas enquanto isso não acontece e eu consiga fazer um pezinho de meia para viajar até lá, cuidemos da nossa cidade.

domingo, 25 de outubro de 2009

Coração cansado.

Dizem que quando estamos com o coração apertado a melhor maneira de se entender é escrevendo. Também dizem que o que não está escrito não está no mundo, então hoje dedico esse artigo ao meu coração apertado. Na verdade coração cansado... cansado de ser julgado.
Não estamos livres de julgamentos por nossos atos e ações. A avaliação que também fazemos dos outros também é inevitável, mas a pergunta é: como fazemos isso? Podemos ser críticos com pessoas que não conhecemos? Podemos conceituá-la a partir de que?
Na verdade não damos chance nem para nós mesmos de entender e ver o outro. Nem nos lembramos de enxergar o próximo como ele é sem estarmos presos a estereótipos criados por uma sociedade que nos rotula como se fossemos produtos ou mesmo diante de nossos preconceitos.
Sei que o desconhecido assusta, principalmente para nos que estamos bem próximo dos 40 ou acima deles e também para quem já teve más experiências de vida ou desapontamentos. Confiança não de compra, se conquista. Mas como é possível crer se não nos abrimos? O medo do desconhecido é cruel. Limita-nos, tira-nos o direito de viver tantas coisas boas, de crescer e se enriquecer com a convivência, de perceber a sutileza de um gesto e de olhar no olho do outro a vontade de ser feliz.
Medo de ser feliz! Medo de acreditar que há outras formas de viver! Medo de entender que cada um tem características próprias e que a grande sacada é aprender a conviver com elas. Pois todos nós, de uma maneira ou de outra, aprendemos a conviver com os nossos pais, irmãos, amigos e colegas de trabalho. Todos, sem exceção, têm coisas que gostamos e outras que nem tanto. Mas que nem por isso deixamos de gostar deles.Mesmo com o coração cansado ainda acredito nas pessoas. Ainda acredito na idéia do olhar do próximo. Ainda acredito na vida e, certamente, ainda me permito acreditar na felicidade.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Maceió, a sua cidade.

O Ministério das Cidades surgiu em 2001 e desde então força as cidades a pensar o que são e onde querem chegar estabelecendo um novo conceito de gestão. O planejamento das cidades com uma gestão participativa vem impulsionando, aos poucos o Brasil e se refletido em nossa cidade. Para nós, urbanistas, uma grande conquista, porém o mais importante é a consciência política da população para participar como cidadãos.
Fala-se que o regime militar nos deixou uma lacuna enorme e sem consciência política. Na verdade a ditadura teve um efeito devastador e nós podemos senti-lo através da falta de conhecimento e iniciativa do povo.
Lembro-me que o ano passado os alunos do CESMAC foram convidados a participar de uma palestra sobre a ditadura militar, ministrada pelo respeitado advogado e criminalista José Moura Rocha. O resultado: uma platéia que custou a perceber o que aconteceu com o Brasil. Como é possível?
Somos pacíficos demais, falamos pouco e agimos menos ainda. Na verdade, o que temos feito, enquanto cidadãos, para melhorar a nossa cidade e nosso país? Você sabe o que se tem planejado para Maceió daqui a 10, 20 anos?
Se você é uma dessas pessoas que não sabem responder essa última pergunta, está na hora de ter um olhar diferenciado e perceber que o poder público não age, ele, ainda, REAGE!
Faço minha parte. Venho de uma educação totalmente pública: estudei do Jardim infantil ao científico no CEAGB (antigo CEPA), sou graduada pela UFAL e pós graduada da UFBA e entendo que minha maior contribuição é devolver para a sociedade, através do meu trabalho urbano, cada centavo de impostos pagos. É difícil ser urbanista sem ser socialista!
Como Diretora de Planejamento Urbano de nosso município tive e tenho a oportunidade de promover discussões populares através de oficinas de trabalho ou audiências públicas. Erroneamente vinculam essas discussões à “manobra” política ou ficam sem entender o que fazem ali. Para nós técnicos, pensar a cidade vai além do que nossos gestores imaginam.
Atualmente, ressalto um dos projetos mais agradáveis que tenho trabalhado junto com a equipe da SEMPLA: o projeto para a área de lazer para o loteamento Benedito Bentes I. Uma área imensa, densa, que há pelo menos 20 anos clama por melhorias. A sociedade já estava descrente com tantas promessas ao longo de tanto tempo. Conseguimos reunir a Prefeitura Comunitária, as associações, a população de um modo geral e colher os dados necessários, projetar com a equipe técnica do município (Secretarias de Meio Ambiente - SEMPMA, Superintendência de Iluminação Municipal - SIMA, Superintendência de Limpeza Urbana - SLUM, Secretaria de Infra Estrutura - SEMIFRA) e efetivamente desenvolver para a sociedade um projeto urbano participativo com a cara de seus moradores.Levamos nove meses para realizar tudo isto, mas tem valido a pena. Segundo o Ministério das Cidades é dessa forma que é legitimado e aceito. Eu digo mais, é dessa forma que esse projeto será abraçado e mantido. Saber que fez parte da discussão e opinou é um verdadeiro remédio anti vandalismo.
Cada um com sua história e a minha estabelece uma relação muito estreita de interação com a população que vem crescendo a cada dia. E não para por aí. O desenvolvimento do litoral norte acontece com uma velocidade assustadora onde já temos uma demanda de reurbanização das orlas desde o bairro de Cruz das Almas até Ipioca. É nessa oportunidade que os grupos melhores organizados conseguem garantir o que querem e como querem. O que estão esperando? Organizem-se! Vamos fazer a diferença?

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

A cor e o Meio Urbano

Uma das coisas mais interessantes no restauro de monumentos históricos é o resgate das feições arquitetônicas e, dentre elas, a busca pela cor original. Mas o que é mesmo a cor original de uma edificação que ao longo dos anos, sujeita às intempéries, desbota, descasca ou até mesmo muda de cor dependendo do humor e gosto de seu proprietário? Cheguei a conclusão que cor original não existe. O que existe é uma sucessão de combinações que temporariamente satisfaz a seu proprietário e que provoca dinamicidade da edificação. É claro que salvaguardamos algumas exceções que estabeleceram sua identidade a partir da sua cor como a Casa Branca e a Casa Rosada.
Comparado a um imóvel, a cidade também está sujeita a esta dinamicidade, porém pode estabelecer, além de tudo, uma identidade.
A adoção de uma cartilha de cores é muito comum também na conservação de áreas urbanas (sítios) históricos, neste caso, para direcionar nas escolhas dentro de um partido coerente com as cores que se usava na época original das edificações, pois sabemos que, até bem pouco tempo, havia uma grande limitação técnica de tintas a base de cal restringindo-se ao branco, amarelo, azul, rosa e verde claros.
A evolução tecnológica da fabricação de tintas teve como conseqüência uma explosão ilimitada de cores que nos deu inúmeras possibilidades; até mesmo transformar as lojas de tintas numa espécie de self service de cores ao alcance de todos.
Recordo-me da última visita ao interior do Estado de Alagoas quando conheci a cidade de Piranhas, ao longo do Rio São Francisco. A paisagem no final da tarde revelava, além da beleza local, uma combinação de cores perfeita demais para uma cidade interiorana. As cores suaves não só das cores primárias, mas também nas inúmeras variações de lilás, roxo, salmão e beges, revelavam sutilmente a escolha proposital daquela combinação não compatível com uma cidade que surgiu no século XVII. Soube posteriormente que a Prefeitura local se encarregava todos os anos, de pintar cada casa e, a escolha dessas cores, também estava a cargo do Município. A idéia foi acolhida pela população, que apreciou, assim como nós turistas. A verdade é que essa política motivou a conservação de todos os outros ambientes da cidade como praças e ruas que, milagrosamente, tinham bancos em réguas de madeira pintados de branco sem nenhum arranhão ou ato de vandalismo como pichações ou declarações de apaixonados. A partir daquele dia entendi que podemos mudar valores e hábitos com ações muito mais simples do que imaginamos.
Também podemos ver exemplos do outro lado da moeda quando nos depararmos com cidades inteirinhas pintadas em cores absurdamente incompatíveis, justamente por serem elas as cores de um partido político ou mesmo adotado pelo gestor em sua campanha. E assim as cidades mudam de cor a cada quatro ou oito anos, e muitas vezes, sob o protesto dos próprios moradores que vêem empurrados por “goela a baixo” ou, melhor, por “olhos a dentro”.
De uma maneira ou de outra, com ou sem discernimento estético, a partir do momento que pintamos o meio urbano também estamos provocando uma sensação de cuidado e limpeza, o que me parece bastante importante e necessário para uma população que sente tanta dificuldade de manter uma cidade limpa assim como a sua própria casa.
A idéia de limpeza também pode ser observada no novo estilo que vem surgindo nos últimos anos com a idéia clean da arquitetura moderna. O tão usado e abusado branco percebido nas novas edificações se baseia na idéia de ambiantes limpos, não só na concepção de elementos arquitetônicos, com o uso de formas puras, mas também no cuidado do uso, quase que totalmente, da cor branca. É facílimo perceber o que digo; basta dar uma passeada na Avenida Álvaro Calheiros e Mário de Gusmão onde encontramos os mais variados exemplos de estabelecimentos comerciais como lojas e galerias que mostram fortemente essa tendência ou mesmo passear nos novos loteamentos onde a maioria das casas também são concebidas assim. E assim, mesmo se tratando de imóveis particulares, cria-se um ambiente construído com características peculiares ao nosso tempo, fáceis de identificar,futuramente, como uma idéia de nossa década.
Pois bem, a verdade é que penso que a cor é fundamental na nossa vida, nos renova, e, assim como nós, os espaços urbanos também. A dinâmica da vida colorida muda nossas escolhas e sensações, humor e temperatura. Nos diferencia também.
Quando cursei a especialização em restauro de sítios e monumentos históricos na UFBA, Salvador, ficava surpresa com tanta “alegria visual”! Apesar de só, sentia-me confortável e acolhida. Tinha a sensação plena de que realmente se tratava de um povo alegre: tinha a alegria das cores, não só nos prédios, mas nas encostas pintadas ou trabalhadas com mosaico colorido, ou mesmo nos pisos das praças e monumentos. Lembro também do verde de João Pessoa e Aracajú. Falar dessas cidades é fácil; mas, e a nossa cidade?
Maceió está crescendo todos os dias. Os espaços públicos estão se renovando e se padronizando. A beleza e o verde do canteiro da Avenida Fernandes Lima e da Praça do Centenário tem me animado todas as manhãs que passo para ir ao trabalho. As flores estão lindas (a mistura de cores é fantástica). Aplauso para Ricardo Ramalho e sua equipe!
As esculturas coloridas fazem a diferença nas praças, os painéis artísticos de Jaraguá são de uma sensibilidade animadora. Penso que começamos a entender como podemos mudar nossa cidade com iniciativas como estas e a cada ação, há uma ótima reação da sociedade que acolhe, aplaude, admira, e o melhor, não picha!

Pelo Patrimônio Histórico

Ao ver restaurada a Casa de Jorge de Lima senti uma grande satisfação de ter participado de um esforço coletivo que durou de 2002 a 2008. Seis anos!Sim, foi exatamente esse tempo que levou toda a maturação, desenvolvimento e implementação da idéia de seu grande mentor: Dr. Ib Gatto Falção.
Restaurar um imóvel não é fácil, a começar da dificuldade que temos em reconhecer a importância do que é Patrimônio Histórico ou não, e como se não bastasse também a dificuldade de se ter recursos financeiros para fazê-lo.
Grande parte do acervo arquitetônico de Maceió pertence a propriedade particular que, geralmente, não possui condições financeiras para arcar com a recuperação física do prédio. O restauro é caro, pois se trata, na maioria das vezes, da conservação de elementos com técnicas e materiais construtivos que não são utilizados no modelo da construção civil atual. E para esse tipo de conservação também é necessária uma mão de obra especializada, o que quase não existe no nosso mercado.
Venho acompanhando a busca incansável da Arquidiocese para restaurar o prédio da antiga Cúria no Centro, em frente a Estação Ferroviária. Há a intenção de restauro, há projeto desenvolvido, porém também há a falta de recursos, empecilho para qualquer realização.
Hoje, apesar de alguns e exemplos de restauro já realizados na cidade como o da Associação Comercial, do MISA, da antiga Prefeitura, do Museu Théo Brandão e agora da Casa de Jorge de Lima, ainda buscamos a restauração de uma série de obras, não só pela condição física precária, mas para garantir um funcionamento digno, e o que é mais importante, estimular e despertar a consciência coletiva para a importância da preservação da memória cultural do Estado. A memória como propriedade de conservar informações, graças às quais o homem pode atualizar impressões passadas.
Na verdade é bem interessante a visão que cada indivíduo tem do imóvel. É nesse olhar particular que há um despertar baseado na experiência individual de cada um e que lhe atribui uma serie de valores. Daí a pluralidade de significados, pois cada pessoa que olha, vê e interpreta algo diferente; a obra de restauro como arte trás em si essa polêmica: não está na sua função a sua característica maior, mas nos valores carregados por essa imagem coletiva.
É assim, com o reconhecimento popular, que avaliamos o edifício como parte da cidade, o qual, de alguma forma, conta a história de nosso povo. Em verdade a imagem coletiva pode ser trabalhada de duas formas; a primeira quanto damos um valor estético ao edifício que mostra um modelo de arquitetura singular ou de referência; a segunda por se tratar apenas de uma referência histórica (como por exemplo, uma casa que não tem valor arquitetônico, mas foi onde morou uma figura ilustre).
Incompreendido por muitos, o Patrimônio Histórico ainda não alcançou seu verdadeiro patamar de importância, pois ainda presencio as dificuldades que os órgãos como o IPHAN-Al, a Secretaria de Cultura do Estado com o Pró memória, e a Secretaria de Planejamento do Município – setor de preservação, enfrentam todos os dias. A dificuldade aumenta com as condições precárias de fiscalização e enfatiza-se com a ignorância cultural de parte da sociedade. Quantas vezes ouvi alguns falarem: “...esse monte de prédio velho, sem valor, é melhor derrubar tudo e fazer tudo novinho”.
Pois bem, na restauração da casa de Jorge de Lima, ao ver o resultado das prospecções de reboco também aprendi um pouco mais sobre a arquitetura local e muito mais sobre a personalidade do poeta. O reboco interno era foi feito com saibro e areia, mas o reboco externo de toda a casa incluiu o cimento, fato que não era nem um pouco comum para as casas da época, pois além de caro, o cimento dava um melhor acabamento e mais rigidez ao material; ou seja, o poeta não economizou e utilizou-se de uma técnica avançada para a cidade, assim como a inclusão de elementos arquitetônicos de vanguarda. Podemos deduzir e reforçar a idéia de busca de coisas novas que o poeta tinha, assim como a necessidade de ser universal e não se mostrar característico de um lugar.
No final do ano passado, a Secretaria Municipal de Planejamento, através do seu Setor de Patrimônio Histórico, realizou uma palestra organizada pela Arquiteta Adeciany Souza e da querida Professora e Doutora Josemere Ferrari, intitulada “Para o Bem do Patrimônio Histórico”. Para tal palestra foram convidadas todas as instituições do Centro, técnicos municipais, arquitetos, assim como comerciantes/lojistas que hoje ocupam grande parte do acervo arquitetônico daquele bairro. Inúmeros convites foram distribuídos e confirmados e para nossa grande surpresa, além dos técnicos e instituições, apenas dois lojistas apareceram. Esse é o retrato da falta de interesse e do descaso com o tema.
Existe também uma visão errônea de que um imóvel considerado Patrimônio Histórico é um imóvel paralisado no tempo e que não será possível qualquer mudança. Essa é uma visão ainda comum para a grande maioria de proprietários, porém pode e deve ser mudada. Em primeiro lugar é importante enfatizar que esse tipo de edificação é singular, com personalidade e característica única. Esse é o diferencial, principalmente para quem deseja utilizar o imóvel com proposta comercial. Até por uma questão de marketing, o diferencial é a essência do serviço ou do produto.
Existem leis específicas para bairros e bens tombados como o Centro e Jaraguá, mas que permitem a utilização para uma série de usos, pois, nós que trabalhamos com esse Patrimônio, temos a maior satisfação quando há a possibilidade de ocupação ou até mesmo de renovação de uso, porém conservando as características relevantes.
Algumas vezes não se faz necessário um restauro propriamente dito, mas sim pequenas reformas como um conserto de telhado, pintura ou até mesmo recomposição de rebocos ou pisos. Esse tipo de iniciativa também ajuda a melhorar o estado de conservação do imóvel.
Na realidade, a grande vilã para destruição dos imóveis sempre será a água; seja aquela que entra pelo telhado em mau estado de conservação, seja por vazamentos de tubulações antigas, sejam tubulações de descida de água pluvial entupidas, ou mesmo por umidade ascendente nas paredes (o que é muito comum). A utilização do imóvel exigirá um grau mínimo de conservação para que esse tipo de fato não ocorra.
Patrimônio também quer dizer riqueza e essa riqueza histórica precisa ser despertada nos proprietários. Como exemplo temos o Ministério da Cultura que criou o Selo da Lei Rouanet como forma de incentivar a restauração do Patrimônio Histórico com incentivos fiscais para empresas que acreditarem e investirem em restauro.
Lembro também que em Maceió há incentivos fiscais com isenção de IPTU de dois, cinco e dez anos para os proprietários que conservar, recuperar ou restaurar, respectivamente, garantido na lei de preservação ao Centro e Jaraguá.
Como Arquiteta Restauradora, e hoje, como Diretora de Planejamento Urbano, fico imaginando inúmeras possibilidades para o Patrimônio Histórico maceioense que é tão rico e farto, porém é difícil falar de valores não palpáveis e aparentemente menos importantes do que outros problemas brasileiros como desigualdade social e financeira de um país novo que ainda está dando os primeiros passos em busca de uma educação digna e que é a base de tudo, inclusive da preservação do Patrimônio Histórico.
“A CASA DE JORGE”
A RESTAURAÇÃO

Aderindo a causa do Presidente da Academia Alagoana de Letras, Dr. Ib Gatto Falcão - em transformar aquelas ruínas em um grande centro cultural, o desafio inicial foi, em 2003, colher informações gerais numa cidade que ainda conta com inúmeras deficiências de arquivos e acervos; além da perigosa tarefa de se fazer um levantamento físico de uma ruína que, a cada dia, se tornava mais frágil, para posterior desenvolvimento do projeto executivo. A assessoria dos acadêmicos Francisco Valoir e Solange Chalita, puderam embasar, com melhor precisão, os dados históricos colhidos para a elaboração do projeto. Assim como a definição do estilo arquitetônico neo colonial, adotado na casa foi esclarecido com a Professora e Doutora em patrimônio histórico, Josemeire Ferrary. Aliás, muitos ainda perguntam, e com uma certa lógica, se a arquitetura é eclética, porém devo sempre esclarecer que apesar de não ter todas as características neo-colonial, a casa, que também se utiliza de elementos de outros estilos, pode se enquadrar em uma arquitetura “híbrida” com fortes tendências para o neo-colonial. Porém destaca-se como acesso principal uma elegante varanda decorada com azulejos coloridos trazidos de sua casa do Sr. Basiliano Sarmento em União dos Palmares.
Para o Dr. Ib Gatto, restaurar a casa de Jorge de Lima, para criar um Centro Cultural, além de garantir um funcionamento digno a este imóvel, valoriza o entorno, estimula a recuperação de áreas hoje deterioradas, o que é mais importante, desperta a consciência coletiva para a importância da preservação da memória cultural do Estado. Significa também preservar sua memória, recuperar a mensagem espiritual nela contida, possibilitado seu diálogo com as gerações futuras.
A história da casa de Jorge de Lima foi também traçada através de depoimentos de pessoas que lá moraram. Pouca coisa se encontrou em livros e documentos escritos, para fundamentar a veracidade dos fatos. Tem-se certeza, porém, que a edificação foi erguida para o escritor alagoano Jorge de Lima, quando regressou do Rio de Janeiro, na década de 1920.
Jorge de Lima morou por alguns anos e depois a alugou. Os inquilinos foram pessoas importantes e influentes no contexto histórico alagoano, a família de Carlos Piatti e a família de Hermani Almeida, são exemplos de pessoas que lá moraram. Os últimos inquilinos foram Manoel Casado de Mello e família, que acabaram comprando a casa em 1958. Depois da morte do patrono da família, suas herdeiras resolveram alugar a casa que foi transformada em clínica médica. Primeiro foi a clínica SUCAN, depois a SAME, entre outras; e várias modificações e ampliações foram feitas, descaracterizando sua arquitetura original, como portas e janelas entaipadas e ampliação de parte posterior (quebrando a unidade de conjunto do edifício), criação de elementos que fogem da leitura original da edificação, como colunas esbeltas, novas coberturas, bancos e balcões de concreto, deslocamento da escadaria (...) para adaptar esta antiga residência ao novo uso.
Inserida na Praça Sinimbú, a casa localizava-se numa área de contínua dinâmica de transformação urbana que se deu sempre em ritmo ascendente, atingindo o clímax na década de 1960 com novas construções em terrenos circundantes a Praça, substituindo fortes referências como o antigo prédio do Lyceu de Artes e ofícios, onde em janeiro de 1961 foram iniciadas as obras da Escola de Engenharia. Ao lado desta, uma outra surgiria, também em substituição ao antigo prédio da Companhia Alagoana de trilhos Urbanos. Surgiu então no lugar da velha garagem e oficina de bondes elétricos, uma nova construção para sediar a residência Universitária Masculina e o Restaurante Universitário, ambos construídos por decisão assistencial do reitor Aristóteles Calazans Simões.
A praça Sinimbú também sofreu intervenções ao longo do tempo, principalmete na década de 60 onde ela também foi dividina ganhando bancos e adereços como “um painel todo em azulejos de cores diversificadas, mostrando através de desenhos a economia local, com uma piscina cuja fonte era um “my-joãozinho”. No verso desse mural estava escrita “LÁ VEM O ACENDEDOR DE LAMPIÕES ”, homenagem ao poeta alagoano Jorge de Lima. Assim essa outra pracinha foi denominada JORGE DE LIMA.”(Castelo Branco, 1993:51)”.

Há cerca de quinze anos o edifício deixou de ser clínica e ficou abandonado. Nenhum outro uso lhe foi conferido, e a ação do tempo tratou de deixar o prédio em péssimo estado de conservação. Ao longo desses anos, o imóvel sofreu sensíveis interferências em seu conjunto arquitetônico que descaracterizou seu aspecto e o transformou numa ruína, expressando uma imagem bem diversa do que representou a época de sua construção: um toque de modernidade da arquitetura que se estava fazendo no sul do país, de onde ele (o poeta) encomendou o projeto para implantá-lo num reduto da modernidade alagoana”.
A necessidade de vanguarda no estilo de sua residência vem do seu próprio modo de ver a vida e de sua própria obra na busca do novo, do conceito universal, como podemos perceber em uma de suas citações:
(...) “Fome do eterno, do essencial, do universal. Não venho para a presente fase de minha poesia, por ter falhado como poeta “modernista”, apenas brasileiro. Vi poemas meus se popularizarem. E hoje eles já não me satisfazem mais. Tenho verdadeiramente fome do universal” (...).
O último proprietário tinha por objetivo, em 1997, transformar este imóvel numa estrutura maior para cursos de pré-vestibular. No entanto, não aconteceu, sendo o imóvel comprado pela Prefeitura Municipal de Maceió, na gestão da Prefeita Kátia Born e doado a Academia Alagoana de Letras para posterior Restauro.
A iniciativa de proposta de restauro do prédio segue a diretriz de valorização do bairro do Centro da cidade e sua interligação com o revitalizado bairro de Jaraguá, adotada pela administração municipal, e reflete uma tendência mundial que vem sendo posta em prática, ultimamente, no nordeste: a recuperação dos centros históricos.
Numa dinâmica notável, a Praça Sinimbu ainda é palco de efervescências políticas, desportivas e culturais dos estudantes universitários, representados na antiga reitoria da Universidade Federal de Alagoas/UFAL, hoje seu espaço cultural; além de manifestações políticas em frente ao Tribunal Regional Eleitoral, e INCRA, todos localizados nas ruas que limitam a Praça.
A ampliação do Clube Fênix Alagoana, tapumes e outdoors em frente da Casa de Jorge de Lima a escondem, sendo, até pouco tempo atrás, pouco ou nada notado pela população que ali passa. Somente o olhar investigador e conhecedor da história podia perceber a depreciação e o descaso com uma obra arquitetônica de tamanho valor.
Simultaneamente, a luta do Dr. Ib Gatto Falcão para a aprovação do projeto no Ministério da Cultura, contou com a importante ajuda de seus netos Maurício Breda e Paulo Breda, e de suas competentes secretárias: Vera e Emília, e se arrastou entre 2003 e 2006, através de inúmeros procedimentos burocráticos, cujo suado selo da Lei Rouanet foi o prêmio de tanto esforço. Neste processo, mais um obstáculo pode ser superado com a aquisição da casa pela Prefeitura de Maceió através da sensibilidade dos antão Secretários Daniel Bernardes e Maurício Toledo, durante a gestão da Prefeita Kátia Born e doada para a Academia Alagoana de Letras.Porém este era apenas o início, pois a busca de parceiros investidores também rendeu a Dr. Ib Gatto constantes idas e vindas aos escritórios e gabinetes das esferas municipal e estadual, além de contatos telefônicos com instituições federais e estatais. É impressionante a luta de um homem que, aos noventa e poucos anos, chegava diariamente a AAL as 8:00h e ao sair, as 12:00 conseguia dinamizar as relações com sua notável capacidade de busca e persistência. A inegável contribuição dos acadêmicos Luiz Nogueira e Benedito Ramos, que sempre se fizeram presentes na elaboração dos documentos teve também como resultado, a aprovação dos recursos iniciais, ainda em 2006 e 2007, com Eletrobrás, BNDES, Sindicato do Açúcar e Secretaria Estadual de Planejamento.
Lembro-me também, em 2005, das inúmeras discussões nas audiências públicas promovidas pela administração municipal para elaboração do Plano Diretor de Maceió que, ao tratar das questões de patrimônio, exigia providências quanto ao péssimo estado de conservação da casa de Jorge de Lima. Enquanto sociedade organizada, era clara a visão da importância da restauração para a cidade e suas referências culturais.
Daí em diante a motivação aumenta, não só pelo fato de eu ser uma arquiteta restauradora em busca da valorização do patrimônio histórico, mas pela adesão ao sonho (que poderia ser o último entre tantos realizados) de um homem com visão de vanguarda.
Entendendo que uma obra de restauro é especial e específica, contamos também com a assessoria do arquiteto soteropolitano, Mário Mendonça, professor e pesquisador do CNPQ da Universidade Federal de Bahia, que pode orientar precocemente as intervenções estruturais da casa. Além dele foi contratada a engenheira Fátima Melo para organização dos convênios e fiscalização da obra.
Em 2007, ao promover a escolha da construtora para executar a obra, através de processo licitatório que contou como presidente da comissão o acadêmico Dr. Marcos Melo, a AAL pode, finalmente, autorizar o início das obras no dia 11 de junho de 2007 com a empresa ganhadora Systems Engenharia.
Somando de 2003 a 2006, quase quatro anos se passou para implantar o projeto que, a essa altura, já se encontrava defasado diante da rápida deterioração da casa. Cada dia era um novo dia e a ajuda de prospecções pictóricas e estruturais foram fundamentais para o bom andamento dos trabalhos.
Já com a obra em andamento, o acesso ao primeiro filme alagoano, ainda preto e branco, intitulado “ Casamento é negócio?” , cedido por Keyler Simões, da Secretaria de Cultura, mostrou em seus primeiros capítulos, toda a área externa da casa do poeta, tornando assim o maior e melhor registro iconográfico, que pude encontrar. A partir daí significativas modificações do projeto foram feitas para adequar ao recente registro encontrado.
A casa começa a mudar e o resultado era notado a partir dos comentários dos amigos que, agora, conseguiam enxergar a casa ao passar pela Praça Sinimbú. Na realidade a etapa da pintura da casa “acendeu” a edificação para o olhar curioso da população. Via sempre, ao sair da obra, a amiga arquiteta e fotógrafa Nímia registrando diariamente o desenvolvimento dos trabalhos. Dela deve vir algo especial com esse registro.
Lembro-me perfeitamente do dia em que recebemos a visita na obra das técnicas do BNDES, Sras. Isis Pagy e Jany Santos ; visita esta que contou também com a presença do Presidente Ib Gatto Falcão. Na oportunidae pude ver o emocionante marejar dos seus olhos num contemplamento sincero da transformação do seu sonho em realidade. E assim, olhado para a fachada, ele disse: “ olha como ela (a casa) está bonita (...)!
Depois de restaurado, o imóvel será dirigido pela Academia Alagoana de Letras, através do acadêmico Ricardo Nogueira, e se transformará num Centro Cultural que terá por fim desenvolver a educação e a cultura literária de Alagoas, procurando, para a realização de seus objetivos, adquirir livros, documentos e manuscritos de homens de letras, sobretudo de Alagoas; manter biblioteca com sala de leitura, arquivos e museus de objetos pertencentes aos sócios falecidos, entreter relações com sociedades congêneres do país e do estrangeiro, publicar a sua revista e trabalhos valiosos que servem de assuntos literários; promover conferências, reuniões, cursos sobre temas culturais; instituir prêmios e horárias e colaborar intelectualmente com os poderes públicos no aprimoramento das letras em Alagoas.
O mais interessante neste contexto é a visão do poeta que, desde a sua época, considerava a Academia de Letras uma instituição condutora de ações com finalidades social e histórica, propósito este que vem sendo a essência do projeto do Centro Cultural Jorge de Lima.
Sobre a Academia Brasileira de Letras: (...) “Não só a minha geração, mas as gerações que nos sucedem hão de procura-la, porque ela representa uma tradição, uma continuidade, uma fundação que dispõe das maiores garantias de perpetuidade. (...) a Academia já conseguiu passar do período de simples representação ornamental para o da finalidade social, histórica, para o interesse humano e não simplesmente nacional. É o nosso maior núcleo intelectual digno de receber as sumidades do panorama mundial de esquerda e de direita”(...).